Desde
novembro de 2009, a
Emenda Constitucional nº 59 assegura a obrigatoriedade do acesso ao ensino a
todas as crianças partir dos 4 anos de idade.
Paralelamente a isso, o Plano Nacional da Educação (PNE) tem como meta ampliar,
até 2020, a
oferta de educação infantil de forma a atender 50% da população de até três
anos – em 2009, essa população era de mais de 10,5 milhões de crianças, mas
apenas 18% delas eram atendidas. Mas como fazer isso sem incorrer no mesmo erro
da expansão do ensino fundamental: cuidar primeiro do acesso para depois cuidar
da qualidade?
Essa ideia do senso comum tem raízes
históricas e ignora os saberes científicos sobre a importância fundamental que
os primeiros anos de vida têm para a formação de cada um de nós e para a
sociedade como um todo. Cuidar da educação de crianças em creches e
pré-escolas pressupõe conhecer os processos de desenvolvimento infantil, as
linguagens que estimulam esse desenvolvimento e a organização de espaços e
atividades, além do desafio de dar atenção tanto a cada uma quanto ao conjunto
das crianças. Trocando em miúdos, para ser professor na educação infantil, como
nos demais níveis e modalidades de ensino, é preciso estudar muito, pois a
tarefa é complexa e de muita responsabilidade.
Acontece que ainda temos muito a
fazer pela qualificação da formação desses profissionais. Segundo o Censo
Escolar de 2011, 61% dos professores de educação infantil têm ensino superior
completo. Outros 29% fizeram o curso de magistério, e 8% possuem apenas o
ensino médio regular. E ainda existem 0,35% e 0,74% que possuem apenas o ensino
fundamental incompleto e o fundamental completo, respectivamente.
Muitos dos professores que começam a
formação estão vinculados às redes por contratos temporários ou são
estagiários, nem sempre permanecem na função e, consequentemente, não completam
a formação. Se não houver concursos bem estruturados e um plano de carreira que
incentive a permanência dos professores na rede e na escola em que lecionam,
continuaremos a carregar água na peneira, investindo na formação de quadros que
mudam com muita frequência, o que impossibilita um trabalho continuado e
coletivo, como requer a docência.
A estabilidade pressupõe outras
questões envolvidas na valorização profissional, como remuneração adequada à
função exercida. Hoje, um profissional com curso de magistério tem piso
salarial de R$ 1.451,00 para trabalhar 40 horas semanais. O valor é bem abaixo
da média recebida pelos profissionais de nível técnico no Brasil, que é de R$
2.085,47. É urgente dignificar o salário do professor de educação infantil,
pois ele é o primeiro contato da criança pequena com a educação formal. É ele
quem apresenta o universo escolar para os alunos. Ele é o responsável pela
socialização dessa faixa etária. É ele que será a referência para as famílias,
e sua atuação repercutirá nos processos de aprendizagem das crianças por muito
tempo.
Garantir atendimento de qualidade na
primeira infância é a efetivação de um direito social básico previsto na
Constituição federal, no Estatuto da Criança e do Adolescente e na Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Mas como garantir esse direito e
cumprir as metas de educação infantil citadas no PNE? Para isso, é preciso que
a sociedade brasileira reconheça a importância da educação para as crianças
pequenas e apoie a luta pela valorização dos profissionais encarregados dessa
educação.
* Patrícia Lacerda, doutora em educação pela Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro, é gerente de Educação, Arte e
Cultura do Instituto C&A.